Suando bicas

*Rodrigo Alves de Carvalho


Alcebíades desde muito novo suava bicas. O parrudinho garoto branquinho suava mesmo sem fazer esforço, sentado assistindo TV ou na sala de aula, o suor escorria de sua testa, o garoto toda hora limpava com a palma da mão e enxugava na camisa, em pouco tempo Alcebíades e a camisa estavam encharcados.

Pior era quando brincava com os amiguinhos, o menino avermelhava o rosto, eriçava os cabelos e suava um rio.

O tempo passou, Alcebíades cresceu, se tornou homem e continuou suando bicas.

Ele sofria, durante o dia precisava trocar de roupa pelo menos quatro vezes e toda manhã era preciso mudar a roupa de cama que amanhecia ensopada com o grandalhão transpirando sem parar jogado na cama.

Arrumar namorada era praticamente impossível. Já era complicado ficar perto de mulheres enquanto o suor brotava de seu rosto, imagina só abraçar e ficar juntinho com uma garota? Se isso acontecesse, ela teria que amá-lo muito para ficar encharcada e pegajosa com o suor alheio.

No trabalho, num escritório de contabilidade, Alcebíades recebia rajadas de vento de um ventilador o dia todo, podia estar ardendo o dia de calor ou no auge do mais frio inverno, mesmo assim terminava o expediente totalmente grudento e fedido.

Alcebíades procurou médicos para tratar do problema, porém suas glândulas sudoríparas sofriam uma rara doença e era impossível reverter o processo. Ele iria suar a vida toda.

Na verdade, seu problema só agravou com o passar do tempo. O rapaz suava tanto que por onde andava ficava um rastro dos pingos que caiam de seu corpo. Se alguém quisesse encontrar Alcebíades, bastava seguir a trilha molhada no chão.

Nos finais de semana o gordinho suador se refrescava no grande jardim de sua casa, nas sombras das plantas, deitado na terra úmida e fria. Ali se sentia bem, mesmo com o corpo molhado e pegajoso em contato com a terra e as folhas secas do chão, à sombra das Damas da Noite e das Roseiras, Alcebíades relaxava e deixava o tempo passar lentamente.

Foi assim que o gordinho branquelo aos poucos se entregou àquela vida em câmera lenta, rastejando pelado no jardim, com o corpo molhado, deixando seu rastro por onde passava.

Alcebíades se transformou numa grande lesma!

Todos se conformaram com a sina de Alcebíades, o coitado estava predestinado a ser uma lesma desde que nasceu...

Morreu esturricado no meio do jardim depois que malvados garotos jogaram sal em seu corpo só pelo prazer de ver Alcebíades derreter lentamente.

*Jornalista, escritor e poeta, nasceu em Jacutinga (MG), possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores.

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