Detetive sobrenatural

*Felipe Pereira


Harold Harry trazia uma longa bagagem no quesito criaturas sobrenaturais. Havia duas décadas que ele caçava e neutralizava esses seres que pairavam sobre a Terra. O detetive Harry era um homem calmo e preciso, não desperdiçava palavras e era um bom ouvinte.

Harold pousou no aeroporto privado da família Adomas, era ali que vivia o prefeito Benas Adomas, na cidade de Bauska, Letônia.

O detetive teve um voo sossegado e sem surpresas.

 — Detetive! É um prazer recebê-lo em minha residência. — Cumprimentou o patriarca Benas Adomas.

 — O prazer é meu, Sr. Adomas.

 — Obrigado por vir. Como eu disse em minha carta, há pessoas desaparecendo. Quando são encontradas, há marcas estranhas nos corpos.

 — Que tipo de marcas? — o detetive indagou.

 — Parecem-se com desenhos de animais.

 — Curioso. — Harry pôs-se a pensar. Se as marcas tratassem de hieróglifos, o caso seria um pouco mais delicado. — Poderia ver um dos cadáveres?

 — Claro! Nosso motorista irá levá-lo para onde deseja.

Vinte minutos depois, Harold estava examinando três corpos. Os temores do detetive se concretizaram, eram hieróglifos. Ele traduziu: “Sangue pelo sangue”. Harry se questionava, o que uma criatura egípcia estava fazendo na Letônia? A explicação mais plausível que encontrou foi a de que alguém a invocou. Nesse caso, quem fez o ritual de invocação precisaria ser extremamente conhecedor das artes de invocação, pois seres do Egito eram receosos e soberbos, não abandonariam sua pátria, e isso explicaria a sede assassina da criatura.

 — Quem foi a primeira vítima? — interpelou o detetive ao médico legista.

 — Já foi enterrado. Tratava-se do delegado Darius Karvelis.

 — Qual o tempo entre os desaparecimentos? — inquiriu Harold.

 — No começo, entre a primeira e a segunda vítima, o tempo foi de aproximadamente duas semanas. Esse tempo foi-se encurtando.

 — Agora, como está a situação?

 — Tem dia que desaparece até mesmo duas pessoas.

 A criatura estava agitada, querendo voltar para casa, pensou Harold Harry. Mas por que, então, ela ainda não foi libertada?

 — Algo te incomoda, detetive? — perguntou o legista.

 — Teria como me deixar a sós com esses cadáveres?

 — Tanto faz, eles não vão sair correndo mesmo. — O legista se retirou, gargalhando da própria piada. Harry achou a piada de mau gosto, essas pessoas estavam mortas, mas mereciam respeito.

O detetive retirou do bolso um pequeno pedaço de giz e fez um hieróglifo de invocação. As marcas que estavam nos corpos derramaram sangue. O sangue foi escorrendo até amontoar-se no desenho que Harold Harry fez no assoalho. O plasma formou um anúbis. A criatura encarou o detetive e, rosnando, disse:

 — Por que me chama? Já não me basta um Mestre, agora preciso atender a dois?

 — Venho para libertá-lo. Qual contrato você fez com o Mestre anterior? Quantas vidas ele encomendou?

 — Não foi uma encomenda, foi um laço de sangue. Sangue pelo sangue. Enquanto meu Mestre viver, estou preso a ele.

 Harry espantou-se. Era perigoso fazer um laço sanguíneo com uma criatura mítica.

 — Quero um contrato! — disse Harold.

 — Estou cansado, quero voltar para casa. Não me ponha mais um fardo! — reclamou a criatura, com gravidade.

 — Ouça minha proposta! Dê-me o nome que preciso e te darei sua passagem de volta para o Egito.

O anúbis ponderou a situação, encarou o detetive com um olhar feroz e disse lentamente:

 — O nome é Edgaras Jasaitis. — Dada a informação, o ser mítico se desfez.

Harold pediu ao motorista do prefeito para levá-lo à delegacia. Trinta minutos mais tarde, ele estava de frente com o investigador Herkus Bagdonas.

 — Tenho seu suspeito. Edgaras Jasaitis.

 — Como conseguiu chegar a essa conclusão? — questionou Bagdonas, cauteloso como mandava o ofício.

 — Tenho minhas fontes, assim como o senhor têm as suas. Neste momento, precisamos trabalhar juntos para pôr fim neste caso.

 — Foi alguma fada que lhe disse o que fazer? — indagou Herkus com sarcasmo.

 — Apresentei a você o Mestre, o sujeito que invoca uma criatura para executar um contrato. Mas Edgaras fez um de sangue. — Explanou Harold sem se perturbar.

 — O que isso tem a ver com o caso? — interpelou Bagdonas, que não entendia muito dos seres sobrenaturais.

 — Sendo sucinto, Edgaras tem que morrer para o anúbis ir embora e as mortes pararem.

 — Hum! Não há outro modo?

 — Receio que não!

Fizeram silêncio. Passados alguns segundos, Herkus tornou a falar:

 — Edgaras não é nenhum santo, mas não gosto de assassinato a sangue-frio. O suspeito em questão, fugiu da cadeia alguns meses atrás e enviou uma carta ao delegado jurando matá-lo no momento mais oportuno. Darius Karvelis, nosso falecido comandante, não desprezou a ameaça, porém, não fez grande alvoroço. Se Edgaras é realmente nosso homem, agiremos conforme a lei. Se precisar de força letal, assim será.

Foram necessários vários dias de preparação e planejamento. Desde a descoberta do paradeiro de Edgaras até as provas concretas da sua autoria dos crimes.

Chegado o dia do confronto, uma pequena tropa de elite postou-se nos lugares estratégicos. Escondidos do campo de visão do criminoso. Apenas Harold e Herkus ficaram à vista do contraventor.

 — Edgaras Jasaitis, você está preso por assassinato. — Declarou o investigador Herkus Bagdonas.

 — Será preciso mais do que seu pequeno esquadrão para me deter. — Arrematou Jasaitis.

 — Então ele sabe, — murmurou o investigador para Harold.

 — Claro que sabe! Ele tem um anúbis sob seu domínio.

Subitamente, gritos foram ouvidos; os policiais de elite estavam sendo atacados por uma criatura humanoide com cabeça de chacal. Quanto mais atiravam, mais irritado o anúbis ficava.

 — Que demônio é este? — desesperou-se Herkus.

 — Esse é o ser que tem matado em nome de Edgaras. — Respondeu Harold Harry. — Só há um jeito de pará-lo e poupar as vidas dos seus policiais remanescentes.

O investigador mal esperou o detetive concluir sua fala e mirou no assassino. O suspeito tentava se esconder atrás de uma parede; com uma sniper que pegara de um soldado caído, Herkus estourou os miolos de Edgaras.

Neste instante, o anúbis parou de atacar. Harold Harry aproximou-se dele e proclamou:

 — Volte para o lugar de onde veio, não precisa mais lutar.

O anúbis fez uma reverência e desapareceu.

Desta forma, encerrou-se mais um caso do detetive sobrenatural.

*Estudante de contabilidade, morador em Nova Andradina e autor de livros

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal da Nova

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