Pessoas brasileiras, pobres e pretas medalhistas nas Olimpiadas

*Claudinei Araújo dos Santos


O que a educação enquanto espaço escolar tem a ver com as medalhas nas Olimpiadas? A relação educação, esporte, lazer e cultura precisam abranger a formação socioeducacional da população. A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte, a gente não quer só comida, a gente quer saída para qualquer parte. Nós temos sede de muito mais. Anos atrás duas estudantes marcaram minha compreensão docente. Ambas, estudavam na escola que lecionava, diga-se de passagem, uma escola com bons índices nas provas externas, SAEMS, SAEB, Prova Brasil, etc.

As duas meninas, estudiosíssimas, no período matutino estudavam no ambiente escolar. O período vespertino preenchia cada dia da semana com atividades diferentes. Cursavam inglês, faziam cursinho pré-vestibular e ainda duas vezes por semana, treinavam basquete e voleibol, eram factualmente diferentes nos resultados escolares. Fui professor naquele período em duas escolas, a primeira, os/as adolescentes tendo melhores condições socioeconômicas e acesso à educação consideravelmente boa, pública. No contraturno, grande parte destes/as estudantes realizavam cursos de idiomas, praticavam esportes, aulas de alguma formação complementar. Na outra escola, haviam diversos projetos. Estudantes oriundos/as em sua maioria, de famílias mais pobres, vários deles moradores na periferia pobre. Meus filhos, foram exemplos desse processo, teatro, aulas de pinturas em tela, teatro, dança, a educação fazendo parte da relevância social desses/as adolescentes. A escola, promovia processos sempre inclusivos.

Não se trata de qual escola atuava melhor, mas, de que a educação não se desvincula do esporte, da cultura, do lazer, precisam caminhar na mesma direção. As escolas que, na sua clientela tem maioria de classe média, permite que os/as estudantes tenham acesso a diversidade de condições e formam, do ponto de vista educacional, estudantes que fazem práticas esportivas e outras mais. Enquanto as escolas, com clientela de periferia pobre mormente ficam sem acesso a práticas educacionais, de língua, cultura, lazer, e/ou mesmo de outras situações que permitam ter diferentes relações que vão além das salas de aulas. O que se pede, é que todas as crianças, adolescentes de jovens possam ter acesso a educação, cultura, lazer, inclusão para práticas sociais.

A escola deve o espaço ideal para essas práticas e permanências dos estudantes. Sou crítico ao governo Lula, quando cedeu aos desaforos congressistas e permitiu Ana Moser, ex-jogadora de voleibol sair do Ministério do Esporte. Ana Moser, foi substituída devido a negociações parlamentares com o executivo nacional. André Fufuca, atual ministro dos esportes, é filho do prefeito de Alto Alegre do Pindaré, - Maranhão. A profissão de André Fufuca? Médico. A troca foi política.

Desde que Ana Moser deixou o ministério, parece-me, inexistentes, ministro e ministério dos Esportes. Um possível erro, ter ministério do esporte, ministério da educação e ministério da cultura. Países desenvolvidos colocam essas relações na mesma pasta ministerial, não se desvinculam. Como conviver com tudo isso? Simples. Na escola.

Temos falado em educação em tempo integral e pouco se fala em educação integralizadora. Quero dizer, que um dos piores locais para se estar são os espaços escolares. Muros altos, quem está fora não vê dentro e quem está dentro não vê o que acontece fora. As escolas, são assim no Brasil. É um projeto, fazer com que a escola pareça presídio, quatro paredes e uma porta bem fechada, não permitindo que a escola tenha elo com o mundo social.

De acordo com Silvia Gasparian Colello, professora da Faculdade de Educação da USP, há algum tempo o país investe em escolas de tempo integral, e, o número de desistência acontece em dados consideráveis. Motivo? Sete horas exaustiva dentro do perímetro escolar, é cansativo, ficar cerca 08 horas ouvindo professores falarem e repetirem assuntos que na maioria das vezes nunca terá relação com a vida de nossos estudantes. O que é preciso fazer? Segundo, Silvia Gasparian Colello, “ela [a criança, adolescente] tem que ficar meio período na escola convencional e meio período com atividades diversificadas, como artes, esportes, música e um momento de trabalho individual onde ela poderia fazer os deveres de casa.” 

Nesse sentido, apontamos que a escola não precisa apenas ser de tempo integral, é necessário ser integralizadora. Quantos meninos e meninas encontramos por aí e falamos: essa/e menina/o seria ótima/o atriz/ator, musicista, se daria muito bem no teatro, nas artes marciais, na ginástica artística, no voleibol, basquete, xadrez, handebol, futebol, todavia, teve que deixar os estudos para trabalhar. Boa parte dos nossos praticantes das atividades aqui relacionadas começam suas atividades em idades posteriores ao comumente iniciada nos países que investem em educação, cultura, esporte e lazer.

É possível observarmos Rebeca (ginástica), Raíssa (Skate), Rafaela, Beatriz (judô), entre outros e outras jovens pobres e pretas conquistando medalhas nas olímpiadas. Questiono: onde está o treinamento para essas conquistas? Nas maiores partes das vezes, nos clubes, Flamengo, Pinheiros, projetos de fundações, etc. E o Estado? E a educação? Porque as escolas de tempo integral não levam nossos/as atletas para os jogos? Simples, não são integralizadora. “Há problemas de orçamento, de dinheiro, problemas de interesse. Há famílias e alunos que não estão interessados em ficar o dia inteiro na escola”, explica Nílson José Machado, professor titular da Faculdade de Educação da USP.

É preciso fazer com que nossas crianças permaneçam no ambiente escolar. É um bem social, é investimento que em duas ou três décadas mudam a história de um país.

No entanto, atitudes sérias não são tomadas, escola que integra, com esporte, cultura, lazer, ensino e aprendizagem escolar, são esquecidas em prol de escolas que prendem crianças e adolescentes por oito ou nove hora no ambiente escolar. Do ponto de vista conteudista, costuma fazer diferença sim. Do ponto de vista social e prático para desenvolver aptidões que nossas crianças, adolescentes, jovens podem ter, pouco acontece. Surge novo questionamento: porque nossos adolescentes abandonam tanto as escolas, particularmente as de tempo integral. Simples, são pouco atrativas e parte dos/das estudantes necessitam deixar a escola, peculiarmente no ensino médio e trocar o tempo e aprendizado escolar pelo emprego que ajudará no sustento de casa.

Estamos apontando aqui, alguns dos motivos pelo qual o Brasil sobe pouco ao pódio não apenas das Olímpiadas esportivas, mas, sobretudo, as olímpiadas de ciências, humanas, da natureza e ciências exatas. Observem China, Coréia do Sul, Austrália, Japão, estão alcançando índices altos de pontuação nos jogos esportivos olímpicos. Sabe o que fizeram esses países? Investiram em educação, cultura, lazer e esporte. No caso do Brasil: de quem é a culpa? De todos os governos que brincam de fazer educação. Educação, precisa ser integralizadora, enaltecer aptidões de nossos/as estudantes. Tem que preparar para o trabalho! Também. Nem todos querem ir para a universidade, ser atleta, ator, atriz, músico, dançarino, pintor/artista. Certo. Muitos querem apenas seguir a profissão dos pais, dos avós, dos tios, ótimo. Mas, todos querem ter oportunidade de serem alguém na vida e viverem a infância, a adolescência, a juventude, de serem felizes com suas escolhas.

O que não pode acontecer?

Não podemos continuar com um país que finge dar oportunidade aos seus filhos, é necessário tomarmos uma atitude urgente em prol de uma educação integralizadora. A escola pode ser de tempo integral, precisamos. No entanto, se ela não for integralizadora, continuaremos com políticos que acreditam que educação é gasto. Gastarão fortunas nas infraestruturas e esquecerão das estruturas. Nossas e nossos meninas/meninos pretas/pretos e pobres quando tem oportunidades, são medalhistas nas olimpíadas, sobretudo, na vida. Na concepção do Professor Nilson Machado, “Você pode ficar dez horas na escola se entupindo de aula sem que escutem você falar ou você pode ter menos aula em escolas que não podem dar uma carga tão grande, recebendo a atenção de um modo geral do professor.” A escola integralizadora, é um bem a sociedade, além do ensino escola/conteudista, é necessário dar vida cultural, esportiva, em que o retorno social poderá ser maior e melhor.

*Professor Substituto - Área Educação – UFMS – CPNA – Curso de História Doutorando em História – UFGD – Pesquisa Colonização de Nova Andradina

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal da Nova

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